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Especialistas defendem que educação só tem a ganhar com recurso às novas tecnologias

 
Futuro da educação em análise no BNP Paribas Portugal
 
A 2ª edição do ciclo Challenging the Future, evento organizado pelo BNP Paribas Portugal, promoveu uma discussão sobre “A educação hoje: novas Fronteiras”, moderada pelo jornalista João Miguel Tavares e que reuniu um painel de especialistas: António M. Feijó, Clara Palma, Miguel Herdade e Susana Peralta.
 
No contexto do tema que deu mote à conversa, a conferência centrou-se no papel das escolas perante a crescente importância da tecnologia na vida das crianças e jovens, nos desafios criados pelas ferramentas de Inteligência Artificial, na relação entre os curricula e as necessidades das empresas, bem como no papel e importância da família.
 
António M. Feijó, Professor emérito da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, perante os novos desafios da educação, defende que “Em Portugal, olhamos para o diploma universitário como o brevet de um aviador. […] É muito difícil condicionar a universidade para preparar os seus alunos para fins específicos na economia genérica. […] A economia é mutável, é crescente. Hoje o que interessa é que alguém seja preparado com uma série de exposições e de capacidades que lhe permitam fazer diversas coisas”.
“O conhecimento intelectual em si é uma forma de contentamento e as pessoas gostam de aprender […], pelo que “será uma mais-valia introduzir matérias como a literatura francesa num curso como o de medicina”, por exemplo.
 
Já Miguel Herdade, Associate Director do Ambition Institute (UK), usa a sua experiência internacional na área da educação para analisar o ensino português concordando que “Temos um sistema de ensino que alimenta as necessidades técnicas do mercado de trabalho e isso é limitativo, porque o papel das universidades não é só formar para o mercado”. “Faz falta ver a universidade como um sítio que expande as fronteiras do cérebro humano e que enriquece os conhecimentos de cada um”.
Partindo deste pressuposto do enriquecimento curricular, o especialista lembrou que “a faculdade serviu para me ensinar a pensar”, pelo que acredita que neste momento atual de desafios motivados pelas novas tecnologias, “vão fazer-nos voltar lá atrás e regressar ao teatro, aos clássicos, às artes”.
“O que temos agora é uma grande oportunidade de olhar e resolver os problemas da nossa educação. Sou um grande otimista nesta matéria. Não é por haver um ChatGPT que vou deixar de pensar, porque para usar estas ferramentas tenho de saber o que lhes vou pedir ou perguntar.”
E continuou dizendo que “muitas das discussões sobre as novas tecnologias são aquilo a que os ingleses chamam de “dead cat”, o “gato morto”, que atiramos para distrair daquele que é o problema principal. E o problema que temos em Portugal é a pobreza das crianças nas escolas, o cenário de termos uma próxima década sem professores”.
“Há muitos problemas com os ecrãs. Mas qual é o problema que se quer combater? O comportamento dos jovens? A distração das aulas? A desigualdade no acesso ao ensino? Aqui (em Portugal) não temos resposta direta a esta questão.”
“Há o medo de a tecnologia poder ser usada para manipular, mas podemos usá-la para personalizar a educação, libertar recursos e criar modelos em que uma criança pode dirigir-se ao seu aparelho e ter as respostas de que necessita, em vez de esperar para estar de novo na sala de aula para tirar dúvidas. O ChatGPT pode ajudar os alunos mais desfavorecidos e que têm mais dificuldades nas escolas e tirar carga aos professores.”
 
Por sua vez, Susana Peralta, Professora de Economia na Nova SBE, proporciona uma visão sobre o assunto, enquanto formadora. “A minha ideia é que é absurdo o medo que temos destes aparelhos e destas ferramentas. Enquanto professora, para mim é um desafio propor trabalhos que não possam depender de um ChatGPT e não me chateia nada que submetam a correção de um trabalho à ferramenta. Se for no caso de uma tese de licenciatura, naturalmente que temos de lhes exigir que haja uma base de pesquisa que só pode ser feita pelo aluno e dotar o trabalho do cunho pessoal.
Não tenho a veleidade de querer obrigar que alunos - e mesmo os meus filhos - fiquem afastados daquela que é a realidade deles, que recorre ao uso destas ferramentas. Cabe-nos ensiná-los a lidar com elas. Sou a favor de ensinar a autorregular. As tecnologias oferecem possibilidades incríveis de aprendizagem. São contributos para a interação humana, e não substitutos.”
 
Em representação dos alunos, Clara Palma, Vice-Presidente da Política Educativa Associação Académica da Universidade de Lisboa (AAUL), admite que “a tecnologia sim, é útil na faculdade”. E dá um exemplo prático: “ninguém tem capacidade financeira para comprar três ou quatro livros para cada cadeira, por semestre, e é nesta matéria que a tecnologia nos ajuda.” No entanto diz que “a Inteligência Artificial e o ChatGPT não estão a ter ainda grande impacto na minha faculdade, porque ainda não nos consegue ajudar em respostas a casos práticos, onde haja necessidade de espírito crítico”.
Para além deste tema, o debate também versou sobre a necessidade de ajustar os conhecimentos dos alunos às necessidades do mercado de trabalho. Nesta matéria, a estudante confessa que “sem teoria não conseguimos alcançar os conceitos básicos, mas no meu curso de direito percebe-se que quando acabamos os quatro anos, não estamos preparados para a vida laboral. Isto é transversal à maioria dos cursos e no mercado de trabalho depois preferem contratar pessoas com experiência em vez de recém-licenciados.” E acrescenta que “os cursos têm de acompanhar o progresso porque o mundo continua a avançar”. Aqui, “os dirigentes associativos têm o papel de fazer a ponte entre aquilo que obtemos da formação superior e aquilo que nos vai ser pedido no mercado de trabalho; existem programas que nos ajudam a interagir com advogados e a ter essa noção mais da parte prática da profissão, mas não é suficiente e não está ao alcance de todos.”
 
António Feijó, acrescenta ainda que “esta geração de estudantes universitários está constantemente pressionada pela questão do que vai fazer a seguir, e isso é horrível. Este devia ser o tempo de viver a acumular experiências sociais”, reforçando a ideia de que os currículos devem contemplar mais partilhas de conhecimentos e aquisição de diferentes competências tanto “individuais como sociais”.
Para o Professor emérito, o recurso às novas tecnologias, quando feito com o propósito errado, pode afetar essas competências, já que “escrever reflete a construção de uma lógica cerebral, e isso não é tão simples assim”.
De forma geral, António Feijó também não concorda que tenha de se “pensar que as universidades devem sempre preparar os jovens para as necessidades do mercado, porque é desajustado, ficaremos sempre aquém, já que a economia não é constante, tudo é mutável.”
 
Susana Peralta complementa esta ideia, e reconhece que “na economia - que é uma ciência social - sente-se essa procura e frustração da parte dos estudantes, que aquilo que ensinamos tinha de estar mais dentro dos estudos gerais e aplicáveis ao dia-a-dia. Penso que os mestrados integrados acabaram por retirar a parte das ciências sociais do curso de economia, deixaram só os técnicos e a resposta ao mercado tem de ser ambivalente, para se poder ajustar a essas necessidades que vão emergindo.”
Por fim, as desigualdades sociais, como outro ponto de especial preocupação. Todos os oradores admitem que a diferença no acesso à educação e os diferentes tipos de educação acabam por se refletir na competitividade do país e das novas gerações.
Susana Peralta lamenta a experiência pouco livre dos alunos, “Esta geração foi impedida de namorar, de se encostarem uns aos outros, de sentirem o toque e os afetos. (…) O papel das gerações mais novas está totalmente arredado das discussões atuais. E a desigualdade também se vê nisso.”
 
Miguel Herdade concorda e lamenta que “dados europeus continuam a mostrar que os portugueses  ainda acham que há etnias mais inteligentes que outras.” Mudar isto pode passar pelas mãos dos docentes: “há estudos que revelam que a qualidade dos nossos professores vai impactar as nossas vidas e os nossos rendimentos no futuro, principalmente se estivermos a analisar alunos mais pobres. E os professores precisam de ter essa noção.”
 
Com estes contributos, o BNP Paribas continua a proporcionar um espaço de discussão de temas pertinentes na sociedade que estamos a construir para o futuro.
 
De referir que a primeira edição do Challenging The Future promoveu uma reflexão sob o tema “Banking: “What’s Ahead?”, com a presença de Yannick Jung, Head of Global Banking do BNP Paribas, que partilhou a sua visão acerca do futuro da banca, abordando diversos tópicos como o futuro do trabalho, a transição energética e as mudanças tecnológicas, sustentando a sua visão na estratégia do Grupo BNP Paribas: GTS (Crescimento, Tecnologia, Sustentabilidade).
 

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domingo, 8 de dezembro de 2024 – 06:26:59

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