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Novamente Quiaios…com prazer

Quando ouço alguém justificar a ausência numa qualquer prova, com um comentário do género – “Eh pá, já fiz aquele mapa uma grosa de vezes” – assola-me cá uns fornicoques e dou comigo a matutar – “Serei o único que tira prazer de voltar aos locais onde fui imensamente infeliz? (sinónimo de pastorícia compulsiva) Eu? Que nem tenho tendências masoquistas”.

Não acredito que assim seja, a fazer fé nos cento e tal companheiros que compareceram no Troféu Casino Figueira e olhem que me recordo bem de certas caras com aspecto de sofredoras. Bem feitas as contas, é a quinta vez que me desloco a Quiaios, onde acabo de concluir os nono e décimo percursos traçados por entre dunas e pinhais, ornamentados de um interessante micro relevo, mas também com um aborrecido manancial de troncos e galhos tombados. Claro está, que o filme, apesar de muito rodado, ainda não teve o desfecho que eu gostaria.

Não interessa quantas as vezes que percorremos um determinado mapa, porque o que efectivamente tem importância, é a sua qualidade e a maneira como os responsáveis elaboram os percursos. Em duas etapas de distância média com quinze controlos, conseguiram que o meu escalão apenas dispusesse de um ponto coincidente, que por acaso era o pouco influente 200.

Reconheço que sou um “cabeça no ar”, mas prezo-me de possuir uma excelente memória fotográfica e, salvo raras excepções, não dei conta de pisar os mesmos terrenos em ambas as etapas (os mapas podem confirmá-lo). Também é verdade que se passarmos numa mesma zona em sentido contrário, tudo nos parece diferente, mas não foi isso que aconteceu. O gozo que esta actividade me proporciona, em nada é beliscado, pelas repetitivas visitas que tenho feito a dadas zonas do país, sendo as matas da Figueira da Foz um elucidativo exemplo.

O programa das “festas” alinhava uma etapa de manhã (4.900 mts) e outra à tarde (4.400 mts), em terrenos sobejamente conhecidos da maioria (o pessoal tem cá uma memória), mas que para mim pareceram ser a primeira vez que os percorria. Não posso negar que nesta área já se efectuaram várias competições em anos anteriores, só que me assaltam sérias dúvidas que o “berdadeiro” tenha estado presente. Porventura, quem passeou a sua inigualável classe de “pastor” por estas bandas, terá sido o “espécie” em tempos remotos.

No entanto, uma questão meramente pessoal e de índole existencial deve ser colocada. Se o cenário era assim tão conhecido, porque raio me atasquei uma série de vezes? Mau… estou a ficar senil ou afinal esta zona era apenas contígua a outras, essas sim mais percorridas? Analisando os mapas antigos de que disponho, não detecto nenhum com as mesmas áreas, quando muito uma dúzia de metros quadrados comuns. E para chegar a essa conclusão tenho de recuar a 2006, a um campeonato de distância longa. Ora isso foi há séculos! E queriam vocês que me recordasse do quê? Nem me lembro do que jantei ontem, calha bem.

Para contrariar as informações do “Windguru”, que previam manhã seca e tarde pluviosa, a etapa matinal decorreu debaixo de água, tendo eu apanhado com a bátega mais intensa (só podia!), já na derradeira fase do percurso, como castigo de um inexplicável desvio de rota logo no dealbar da jornada, dado que progredi umas centenas de metros para o segundo ponto, com a bússola aos solavancos (que é como quem diz – mal olhei para o mapa – toma lá três minutos).

Analisando as pernadas, fico com a sensação de que a prova era bastante acessível, mormente pela existência de imensos caminhos que funcionaram como óptimas referências. O que me atrapalhou a navegação, foi a profusão de lixo (de origem “troncófila”, “galheira” e “ramuda”), que me obrigava a problemáticos desvios e me provocou duas ou três quedas aparatosas. Correr pelo meio daquela confusão não é tarefa fácil, sobretudo para tipos com a minha elegância, fazendo lembrar um delicado elefante a saltar suavemente de nenúfar em nenúfar – uma tragédia.

Ou me preocupava a discernir onde colocar os pés, ou estudava o mapa. Depois de segundos a desenvencilhar-me de galhos, quando mirava novamente o mapa, já tinha perdido o fio à meada. Essa capacidade técnica que os orientistas possuem (inata?), de progredir em terreno adverso enquanto lêem o mapa (olho no ouro e outro no bandido), definitivamente não faz parte das minhas características e daí eu não passar de um “berdadeiro orientista”. Se corro não leio, se leio não corro, se tento ambas as coisas…catrapumba…queixos nos silvados.

Não me posso lamentar de atascanços exagerados, mas a dificuldade de algumas progressões aliada a um ou outro equívoco de avaliação, foram-me penalizando no cronómetro (na pernada mais longa perdi quatro minutos para a maioria…e sem contratempos), acabando por me posicionar nos fundilhos da classificação. Quando terminei, estava convencido que os setenta e dois minutos eram excessivos e que não faria mais de que os mínimos 50 pontos, pois o “Super-João” deveria ter voado vertiginosamente sobre as acácias. Afinal alcancei quase 60. Uff! Mas esfalfei o corpinho para resultado tão humilde. E à tarde haveria nova dose.

Depois do almoço, salta para a ribalta a velha história de voltarmos a utilizar o mesmo mapa. Ainda que para a etapa vespertina, o staff do GCF tivesse o cuidado de alterar o local das partidas, viemos a constatar mais tarde que o mapa era rigorosamente o mesmo. Embora e como atrás referi, o traçador tenha conseguido a proeza, de nos deslocar para zonas diferentes das percorridas de manhã.

Não obstante termos sido surpreendidos pelo aparecimento de um ponto de “loop” (novidade que me apraz registar), a verdade é que após o autêntico “model-event” da etapa anterior, toda a gente se sentiu muito mais identificada com o terreno. E se o pormenor do “loop” concedeu um aspecto curioso ao percurso, também foi na sua segunda passagem que me vi grego para encontrar a reentrância desse “114”, colocado de forma inteligente numa zona de vegetação transponível, mas de considerável porte, que reduzia substancialmente a visibilidade.

Na primeira abordagem tudo correu às mil maravilhas, mas na investida seguinte as coisas complicaram, entrei nuns angustiantes momentos de pastoreio (dois minutos de cabeça à roda) e só uma “boleia” providencial me safou de maiores danos - a feliz coincidência de me encontrar no local e no minuto certos (nem sempre o azar me bate à porta).

Definitivamente, não sinto qualquer arrependimento por me ter deslocado novamente a Quiaios. Apanhei chuva inesperada, atolei fortemente as botas na areia, escalei dunas bem inclinadas, sofri uns tombos desastrados (sem consequências, leia-se), atasquei como um “berdadeiro”, corri, tropecei, pulei, suei, piquei a totalidade dos “laranjinhas” (supremo deleite), provei uma deliciosa tarte de feijão, enfim, toda uma variedade de acontecimentos e realidades perfeitamente normais em provas de orientação, que a torna num desafio fantástico e permanente. Se alguém esperava outro género de episódios, enganou-se na modalidade.

Perante premissas tão irrefutáveis, os meus amigos façam o favor de esquecer o factor irrelevante da repetição de mapas. O que realmente importa é o prazer que se desfruta nestas participações e lembrem-se da máxima de um anónimo filósofo orientista - o nível de felicidade alcançado em cada ponto controlado, é igualável a qualquer golão nos futebóis - o resto serão sempre desculpas de mau pagador.

 

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sexta-feira, 21 de março de 2025 – 01:19:51

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